sexta-feira, 11 de abril de 2008

Debate: O fim do Livro (o livro impresso) - Parte I

Alguns comentários adicionais ao debate:

Definição do que é livro.

A palavra latina Liber significa Livro. Numa conceituação mais abrangente que a normalmente adotada, porém mais fiel a origem da palavra poderíamos denominar como livro, qualquer dispositivo de fixação do pensamento, seja um rolo pergaminho, tábuas de madeira, ou até mesmo um DVD, ou conteúdos armazenados em banco de dados e disponíveis na internet. No debate em questão delimitamos este conceito ao livro impresso, pensando no formato que se disseminou a partir século XV com a invenção da imprensa de Gutemberg. Este modelo é uma derivação do códice cristão, o suporte que em determinado momento foi escolhido para registrar as escrituras sagradas se caracterizava por ser um pergaminho recortado com folha soltas, costuradas ou coladas e encadernadas com algum material mais duro, como forma de se diferenciar da literatura pagã. Com a expansão do cristianismo, a palavra Liber perdeu seu significado abrangente e passou a designar apenas o modelo do codice cristão. (MACHADO, 1994).

O simbolismo do livro impresso.

Tendo em vista o exposto acima, podemos sugerir a ameaça ao livro se configura como uma ameaça a um objeto sagrado, tanto por sua origem religiosa do códice cristão, mas igualmente por uma tradição humanista acumulada durante muito tempo. Sendo este última, representado pelo contato com os livros, entendido como um ato que o indivíduo se dispõe a uma meditação silenciosa na qual tem contato com um universo de valores éticos, estéticos, buscando não somente a contemplação, mas processar a busca de sabedoria a respeito do sentido da vida. Com advento dos computadores, este “corpo sagrado” do livro se dissolve na transformação do real para o virtual, do táctil para o digital, pela fragmentação, por uma nova forma de humanidade (BELLEI, 2002).

A velocidade, o desaparecimento do livro e da realidade

Para Paulo Virilio, a instantaneidade da imagem em tempo real provoca o perecimento da palavra (do verbo), neste sentido propõe que “a aceleração tecnológica operou, em primeiro lugar, a transferência da escrita para a palavra falada – da carta e do livro para o telefone e o radio...” (1999, p. 73)

Nesta perspectiva pessimista a ameaça ao livro se daria por “uma morte prematura de toda língua viva”. A aceleração substitui o conversar, o pensar e o escrever, pelo fazer simultâneo de todas estas coisas de maneira cada vez mais rápida.

A falsa inércia do suporte impresso e o início de práticas não-lineares

Mas antes do surgimento do Hipertexto, nos séculos XVI e XVII já ocorriam fenômenos de escrita coletiva como aponta (BURKE, BRIGGS 2004, p. 76) através dos manuscritos onde os copistas alteravam o original e como também com o advento das marginálias (CHARTER, 2002, p. 14) onde os leitores faziam anotações na margens de livros antigos proporcionado uma leitura não linear do texto e gerando conteúdo para futuros leitores dos livros paralelamente ao texto original numa estrutura semelhante aos atuais comentários de Blogs.

Nesta perspectiva a criação de enciclopédia de Diderot no século XVIII propôs um forma mais dinâmica do acesso aos conteúdos, com sua estruturação de entradas em ordem alfabética e com índices e palavras chaves os quais conectam um trecho a qualquer outro trecho. Seria um livro-máquina ou livro-farol (MACHADO, 1994).

Para Santaella (2005) as arquiteturas hipertextuais e linguagem digital presente nas redes de computadores nos possibilita "a capacidade de armazenar a informação catalogada e, através da interação do receptor, transmutar-se em incontáveis versões virtuais que vão brotando na medida mesma em que o receptor se coloca em posição de co-autor. Isso só é possível devido a estrutura de caráter hiper, não sequencial, multidimensional que de suporte as infinitas opções de um leitor imersivo".

Por outro lado,Ted Nelson criador do termo hipertexto nos anos 60 faz abordagem crítica à Internet atual, ao ressaltar a falta de dinamismo, nesta perpectiva ele sugere que há uma limitação motivada pela "tentativa de imitar o papel" que produz uma superfície bidimensional com poucos links, e estes links são unidirecionais, quando poderiam ser multidirecionais conforme seu projeto inicial "Xanadu" (Apud Aquino, 2006).

Referências:

AQUINO, Maria Clara. Um resgate histórico do hipertexto. 404notfound - Publicação do Ciberpesquisa - Faculdade de Comunicação da UFBA. Salvador. ano 6, v. 1, n. 55,•2006.
Disponível em: http://www.facom.ufba.br/ciberpesquisa/404nOtF0und/404_55.htm. Acesso em 01 setembro 2007


BELLEI, Sérgio Luís Prado. O fim do livro e o livro sem fim. Revista Brasil de Literatura, Rio de Janeiro, RJ, v. III, p. 1-16, 2001


BURKE, Peter. BRIGGS Asa. Uma história social da mídia - De Gutenberg à Internet. Tradução: Maria Carmelita Pádua Dias. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,2004


CHARTIER, Roger. Os desafios da escrita.Tradução: Fulvia M. Moretto. São Paulo. Editora UNESP, 2002.


MACHADO, Arlindo. Fim do livro?. Estud. av. , São Paulo, v. 8, n. 21, 1994 . Disponível em: . Acesso em: 08 Abril 2008.


SANTAELLA, Maria Lucia. Potenciais e desafios da sociedade informacional. In: IX CONGRESSO MUNDIAL DE INFORMAÇÃO EM SAÚDE E BIBLIOTECAS. Potenciais e Desafios da Sociedade Informacional. Salvador. 2005.
Disponível em : http://www.icml9.org/program/ . Acesso em 10 nov. 2007.


VIRILIO, Paul. A Bomba informática. Tradução: Luciano Vieira Machado. São Paulo, Editora Estação Liberdade, 1999.

Nenhum comentário: